De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população idosa (60 anos ou mais) brasileira quase duplicou nos últimos anos, subindo de 8,7% em 2000 para 15,6% em 2023. Diante dessa nova realidade, a inclusão digital passou a ser um desafio para os desenvolvedores de tecnologias. Para ajudar os envolvidos nessa tarefa, uma pesquisa realizada no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, apresentou diretrizes de design para auxiliar na criação de aplicativos e plataformas digitais que atendam às necessidades específicas do público dessa faixa etária. O estudo foi reconhecido no último mês com o Prêmio Junia Coutinho Anacleto de Melhor Trabalho de Doutorado no XXIII Simpósio Brasileiro sobre Fatores Humanos em Sistemas Computacionais (IHC 2024).
Desenvolvido por Sandra Rodrigues durante seu doutorado no ICMC, o trabalho propõe soluções para tornar o uso dessas tecnologias mais acessível e seguro, facilitando o engajamento de idosos com as inovações digitais que podem impactar positivamente sua saúde e bem-estar. “Em seus estudos de literatura, Sandra percebeu que essas tecnologias são de difícil interação para idosos. Não consideram suas dificuldades de visão, audição, destreza e as dificuldades cognitivas inerentes do processo de envelhecimento”, explica a professora do ICMC e orientadora de Sandra, Kamila Rodrigues.
A tese de Sandra se destaca pelo olhar sensível para a utilização dessas tecnologias pelo público 60+. Nesse contexto, as diretrizes propostas abordam questões como letras grandes e contraste claro para aumentar a legibilidade do conteúdo, interfaces simples, uso de botões grandes, feedback tátil (vibração) e sonoro, além de mecanismos para facilitar a recuperação de erros. Quando respeitados, esses elementos tornam as tecnologias mais acessíveis aos idosos. Segundo dados da Febraban de 2022, dificuldade de usabilidade, falta de familiaridade com as ferramentas e medo são os principais motivos que impedem a inclusão desse público.
Acessibilidade na prática – Dentre as soluções sugeridas pela autora do trabalho, os dispositivos tecnológicos que monitoram saúde, segurança e bem-estar representam grande oportunidade de transformação em relação à acessibilidade. Em cima disso, o design desempenha um papel primordial para construir tecnologias que se preocupem com a população idosa. “Pensar um design inclusivo deve ser um requisito básico para produtores de soluções computacionais”, reforça a professora Kamila.
Quando dispositivos como smartwatches e smartphones são conectados à internet, lembretes sonoros e visuais podem alertar sobre necessidades diversas da rotina, prevenindo acidentes e aumentando a segurança. Para uma senhora de 75 anos que mora sozinha, por exemplo, as recomendações oferecidas no trabalho de Sandra incluem monitoramento de segurança adaptado às necessidades da rotina. Dentre eles estão: lembretes para levar a chave ao sair de casa, tomar remédios nos horários determinados e cuidados redobrados no banheiro, para evitar quedas.
Aplicação no universo da internet das coisas – Do inglês Internet of Things, a internet das coisas se refere à capacidade computacional incorporada pelos objetos e serviços do nosso cotidiano. Nela, dispositivos físicos conectados à internet trocam dados entre si e com outros sistemas. Ou seja, objetos do dia a dia, como eletrodomésticos, carros e aplicativos, equipados para receber e transmitir dados, alimentam um sistema capaz de aprender e se adaptar às nossas necessidades.
Assim, com as diretrizes indicadas por Sandra, é possível produzir esses dispositivos considerando aspectos que antes eram negligenciados ou excluídos durante o processo de desenvolvimento. Essa preocupação vai ao encontro dos principais critérios de avaliação do prêmio IHC, que preza pela relevância do problema investigado e dos resultados obtidos, originalidade e contribuições da pesquisa para a sociedade.
Orientada inicialmente pela Professora Renata Pontin do ICMC, que precisou se afastar devido a questões de saúde, Sandra deu continuidade ao trabalho sob a supervisão da professora Kamila Rodrigues, que destacou a responsabilidade de substituir alguém com grande trajetória. Com a orientação mais focada nas etapas finais do projeto, Kamila elogiou o trabalho realizado anteriormente. “Ela [Sandra] já estava muito bem formada pela professora Renata, se tornou uma profissional excelente”, finaliza.
Texto: Carolina Pelegrin, da Fontes Comunicação Científica
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